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O X da Questão da educação no Brasil

O X da Questão da educação no Brasil

Para abordar o tema que está na raiz da maior parte de nossos problemas sociais, entrevistamos Ilona Becskeházy, do Missão Aluno da Rede CBN, e Gabriel Corrêa, do movimento Todos pela Educação

Publicado em 25 de agosto de 2018 às 02:40

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Ilana Becskeházy e Gabriel Corrêa, para o X da Questão: Educação. (Reprodução)

Em pesquisa realizada pelo Ibope no Espírito Santo, a educação apareceu em terceiro lugar entre as áreas mais problemáticas, na percepção de 45% dos 812 entrevistados. A preocupação maior foi encontrada entre os jovens, na faixa de 16 e 34 anos (48%), seguidos de adultos de 35 a 44 anos (47%). Entre os mais velhos, acima de 55 anos, a preocupação cai para 39%. A percepção da população pode variar, mas é indiscutível o peso da educação na formação de uma nação mais próspera e, principalmente, com oportunidades para todos. Nesta seção, que até as eleições abordará os temas mais relevantes do debate público, entrevistamos Ilona Becskeházy, do Missão Aluno da Rede CBN, e Gabriel Corrêa, do movimento Todos pela Educação. Os dois especialistas apontam as falhas de gestão e propõem políticas públicas que apoiem o potencial transformador da educação. O primeiro passo, concordam, é melhorar (e muito!) a educação básica.

Os entrevistados

Ilona Becskeházy é comentarista do boletim semanal Missão Aluno da Rádio CBN . Possui 16 anos de experiência na direção de entidades com projetos no setor de educação. É mestre em Educação Brasileira na PUC-RJ.

Gabriel  Corrêa é gerente de políticas educacionais do movimento Todos Pela Educação, que desde 2006 busca estabelecer metas para a educação no Brasil. Possui bacharelado e mestrado em Economia pela USP.

A entrevista

Os investimentos em educação são realmente baixos ou são mal direcionados? Nesse sentido, como melhorar a gestão?

ILONA BECSKEHÁZY: Em todas as políticas públicas, o céu é o limite: sempre se pode gastar mais com insumos, como salários (que é exatamente onde se faz mais lobby) e em instalações ou recursos escolares. Mas precisamos ver em detalhe como funciona a relação custo x benefício na educação brasileira. Aí aparece o caso de Sobral, que paga o piso, gasta a média do Fundeb e tem disparado os melhores indicadores educacionais do Brasil em uma cidade de porte grande (200 mil habitantes, critério IBGE). Eles agora querem implementar um currículo de padrão internacional, onde está difícil?? Nos recursos para produzir material e formação para esse novo patamar. Sim, podemos gastar mais e bem. Mas, antes, temos que identificar quem sabe gastar bem e quem é apenas populista com o dinheiro do contribuinte.

GABRIEL CORRÊA: Temos os dois desafios: ampliar os investimentos por aluno da educação básica e melhorar significativamente a gestão dos recursos. Sobre a ampliação de recursos, é importante frisar que por mais que o Brasil invista um percentual de sua renda semelhante ao que fazem os países mais desenvolvidos, em valor absoluto ainda temos muito o que avançar nos próximos anos para chegarmos aos patamares dos melhores sistemas educacionais. Agora, sempre que falamos na necessária elevação dos investimentos por aluno, é preciso reconhecer que dificilmente isso significará avanços na qualidade da educação se não vier acompanhado da melhoria na gestão desses recursos. Em linhas gerais, isso significa aplicar os recursos em políticas educacionais que já demonstraram ter resultados, tanto no Brasil quanto no mundo.

Há também uma crise de aprendizagem: a maioria dos alunos no último ano do ensino fundamental ainda não é capaz de aprender o mínimo considerado adequado... Como vencer as deficiências da educação básica no Brasil?

ILONA BECSKEHÁZY: Temos que ter um currículo claro e ambicioso, coisa que a Base Nacional Comum Curricular não é, e uma formação docente para aplicar esse currículo em sala de aula. Além isso, material pedagógico e escolar condizente e condições adequadas de trabalho. Ou seja, nada mirabolante, que muitos países já não tenham feito. Compromisso moral com as próximas gerações é fundamental.

GABRIEL CORRÊA: Em primeiro lugar, é preciso que a educação básica ganhe muito mais força dentre as prioridades dos nossos governantes. É preciso blindar o ministério e as secretarias de educação de clientelismos, montar equipes de alta qualidade técnica e ter compromisso com a implementação de ações voltadas para a aprendizagem dos alunos. Para isso ocorrer, precisaremos enfrentar o desafio do baixo incentivo que os atuais governantes possuem para efetivamente buscarem melhorias na aprendizagem. Além disso, há o desafio de garantirmos, com qualidade, políticas educacionais básicas em todo território brasileiro. Apesar de nossa Constituição estabelecer que a educação é nacional, ainda não temos uma estratégia nacional que dê coerência para as políticas adotadas pelos municípios, Estados e União.

Não há uma concentração muito grande de recursos nas universidades públicas, sobrando pouco para o fundamental? É possível mudar essa realidade? Qual é o caminho para ampliar o acesso ao ensino superior, de uma forma sustentável?

ILONA BECSKEHÁZY: O lobby dos sindicatos docentes das Universidades Públicas é dos mais poderosos do Brasil, juntamente com os demais funcionários públicos federais. Universidade tem que servir à sociedade e não o contrário. O caminho do ensino superior deve prever coparticipação dos estudantes. Ainda não há dinheiro para tudo, pois além de outros grupos mais organizados já terem se apoderado dos recursos que poderiam ir para melhorar e expandir um ensino superior público de qualidade, a autonomia excessiva dessas instituições retira delas a legitimidade para reivindicar mais esforço do contribuinte brasileiro para pagar as suas ilhas, quer seja as de excelência, quer sejam as da fantasia.

GABRIEL CORRÊA: O Brasil investe hoje, por aluno, três vezes mais na educação superior do que na educação básica – taxa que é maior do que a percebida em outros países. Por mais que se reconheça a importância do ensino superior, precisamos entender que a baixa qualidade da educação básica ainda é o grande desafio que temos no Brasil.

Como é possível conter a evasão escolar, um problema principalmente no ensino médio? Como tornar o ensino atraente aos mais jovens? Qual o papel da Base Nacional Comum Curricular nesse processo?

ILONA BECSKEHÁZY: Que ninguém se engane: o que acontece no ensino médio é consequência dos descaso no ensino fundamental. Como fazer o aluno do ensino médio ler um texto complexo e adequado para sua idade e interesse (inclusive de disciplinas de humanas), se ele não foi bem alfabetizado e não acumulou vocabulário ao longo da vida escolar? Nós temos problemas gravíssimos de descaso com o que os alunos aprendem desde a educação infantil e agora vamos querer convencer os incautos de que o problema é a falta de tecnologia ou de habilidades socioemocionais! A BNCC deveria ter alinhado todo o processo de aprendizado, como é nos países desenvolvidos. Não sabe fazer?? Copia de quem já fez direito! Mas preferimos criar uma jabuticaba, que nada mais é que o lobby de acadêmicos preguiçosos e editoras para deixar mais ou menos como está. Assim, a contribuição da BNCC será nenhuma... a não ser para aqueles mais interessados, que vão passar a estudar os currículos de outros países...

GABRIEL CORRÊA: O modelo tradicional de escola está ficando ultrapassado e desinteressante para nossos jovens. Somado à baixa qualidade do ensino que vem desde o início da trajetória escolar, isso afasta nossos adolescentes e jovens da escola, elevando as taxas de evasão. Uma nova proposta passa, dentre outros fatores, por aumentar o protagonismo dos alunos em sua educação, por novas tecnologias que conversem com o dia a dia dos alunos e por didáticas que os instiguem à aprendizagem. Sempre com um foco: aprendizagem. Sem isso, não haverá escola que faça sentido para os adolescentes e jovens brasileiros.

A educação é a base da transformação do país. Como governantes podem se comprometer com essa máxima, tornando-a uma realidade?

ILONA BECSKEHÁZY:Começando por garantir uma alfabetização de padrão internacional e ensino básico de matemática idem. Sem isso, não há pirotecnia nem ideias mirabolantes que ajudem.

GABRIEL CORRÊA: Os governantes precisam colocar a educação básica dentre suas prioridades de governo e montar excelentes equipes nos órgãos da gestão educacional. Além disso, cobrar, dar força política e acompanhar a implementação de ações voltadas à melhoria da aprendizagem dos alunos é essencial para que elas virem realidade.

Sobre infraestrutura, o fechamento de escolas por falta de demanda em determinadas regiões é uma opção sadia de gestão da educação?

ILONA BECSKEHÁZY: Claro! Seria bom dar bom uso aos prédios públicos, como fazer centros de convivência de idosos e jovens, centros de formação técnica para jovens e adultos etc. Mas que há escolas que devam ser fechadas/transformadas em outros aparelhos públicos, sem dúvida.

GABRIEL CORRÊA: Qualquer fechamento de escolas precisa ser visto com atenção, uma vez que pode prejudicar o acesso de crianças e jovens à educação. No entanto, precisamos reconhecer também que por uma questão demográfica o número de brasileiros em idade escolar vem caindo vertiginosamente com o tempo, exigindo, em casos particulares, revisões na quantidade de vagas e turmas oferecidas.

 

Quais critérios um eleitor deve levar em consideração para avaliar bem as propostas dos candidatos sobre educação?

ILONA BECSKEHÁZY: Realisticamente, acho muito difícil um eleitor, por mais bem formado que seja, saber entender um plano de educação de um candidato. Acho que teremos que contar com a sorte...

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GABRIEL CORRÊA: É preciso entender se as propostas são realmente viáveis e se estão na alçada do cargo pleiteado pelo candidato. Mas o mais importante é identificar se elas de fato visam resolver o principal problema da educação básica, que é a aprendizagem dos alunos. É nesse sentido que o trabalho do Todos Pela Educação pode apoiar esse processo de escolha, uma vez que identificamos, com um grupo de especialistas suprapartidários, as principais políticas educacionais que precisam avançar nos próximos anos. Essa iniciativa é o #EducaçãoJá.

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